[Publicado do "Diário do Minho" de 2003.02.10] |
Os Museus Pio XII e Medina
João José Rigaud de Sousa
Mais uma vez tenho o gosto de vir ocupar esta rubrica para me referir a uma realização que merece uma nota positiva, a inauguração, em 5 de Dezembro último, da remodelação dos Museus Pio
XII e Medina, devida à acção dos
Rev.os Senhores Cónegos António Macedo e José Paulo de Abreu. Sobre estes Museus já saiu neste mesmo periódico um interessante artigo assinado por Álvaro Magalhães, no qual é dado a conhecer o plano das obras e indicada a data da inauguração que estava marcada para 5 de Dezembro, o que efectivamente aconteceu, ao contrário do que é costume em que as obras sofrem atrasos, o que mostra o cuidado e eficiência com que toda esta foi planeada.
Estes Museus, fundados pelo meu saudoso amigo e ilustre investigador Cónego Luciano Afonso dos Santos, aparecem agora completamente modernizados e com uma disposição
museológica exemplar. O Senhor Cónego Luciano teve o grande mérito de recolher e salvar da destruição uma enorme quantidade de peças arqueológicas e artísticas e teve o cuidado de as ter deixado devidamente
identificadas, o que nem
sempre acontece. Bem me lembro de uma vez ter ido com ele à Capela do Espírito Santo, em Moreira de Lima, e ele me ter chamado a atenção
para uma pedra que aflorava no meio de um terreiro, observando que devia tratar-se de uma ara. Passados dias informava-me, com alegria, que a ara estava no Museu.
Também é de lembrar que ao refazer o jardim do claustro derrubou, se não me engano, uma laranjeira que
tinha junto das raízes um recipiente com uma lembrança da época em que fora plantada e que continuando a escavar foi encontrar mesmo no centro desse claustro um
peristilum de uma casa romana com o seu tanque revestido de mosaicos onde estavam representados peixes (este mosaico é semelhante ao do da Fonte do Milho, Douro). Imediatamente tratou, com a colaboração da Dra. Adília Alarcão, de o preservar, e com o
Arq.to
Fernando Lanhas de um estudo para valorização de todo o conjunto. Infelizmente esta obra não pôde ter seguimento mas, mesmo assim, ele resistiu até agora. Lembro mais de ele, cheio de gosto, identificou um dos peixes como sendo uma carpa.
Mas voltemos ao presente. Não foram só os dois Museus que foram recuperados, foi também a Torre Medieval e a Capela a ela adossada, peças do mais alto valor para o enriquecimento do património da cidade. No interior da torre foi instalado todo um equipamento informático para que o visitante
possa, sem a ajuda de um guia, saber o que está a ver. Do alto da torre disfruta-se um panorama magnífico sobre o centro histórico. Por outro lado foi recuperada a vista de uma parte da capela que havia sido entaipada,
substituindo esse, entaipamento por vidro.
Com esta obra forma-se um valioso circuito que se inicia na capela dos Coimbras,
passa pela fachada do actual Seminário de Santiago ou Conciliar, pelos dois Museus que
aí se abrigam, pela torre, pela capela de Nossa Senhora da Torre, fachada da Igreja de Santiago e finalmente pela Sé. Pena é que tenha desaparecido a casa medieval da Rua D. Afonso
Henriques, e as ruínas romanas que estavam defronte da Igreja de Santiago.
Como ainda resiste à modernização o troço da muralha que ligava esta porta-torre com outra que se situa no Largo dos Bombeiros Voluntários parece-me que seria aconselhável valorizar esse pano de muralhas, hoje escondido entre casas e arbustos, aumentando assim a vista de Braga medieval e ligando este conjunto com o Museu D. Diogo de Sousa, com as ruínas das termas e com os palácios que existem nesta zona (aproveito a ocasião para chamar a atenção de que a frontaria de um dos mais belos, o de S. Sebastião das Carvalheiras (séc. XVIII) se encontra entaipada com uns armazéns), a casa do
Cónego João de Meira Carrilho, na R. de S.to António das Travessas e a Casa da Torre mandada construir por
Luís Álvares Lanhas (antepassado do ilustre pintor e arquitecto Fernando Lanhas) e hoje propriedade da Congregação do Sagrado Coração de Maria. Sobre estas casas ver
Vaz Osório da Nóbrega, Pedras de Armas e Armas Tumulares do distrito de Braga , vol. 1, tomo 11, Braga, 1971.
Não quero terminar sem me referir às diligências que têm sido feitas para recuperar o magnífico
órgão da Igreja de S. Paulo, sem dúvida o melhor de Braga como instrumento, pois nele, depois de recuperado pode ser
interpretada música de todas as épocas, e ao restauro da magnífica talha dessa igreja que no dizer de Robert Smith é o melhor da cidade e até dos
melhores de todo o Pais. Espero que o Senhor Cónego Doutor José Paulo de Abreu, com a energia que lhe conhecemos, leve esta tarefa a bom termo.
Finalmente, quero acrescentar, já que nos referimos à Sé, que a reorganização do Museu do Cabido está para breve e lembrar que se ele ainda está onde deve estar, isso se deve ao falecido Brigadeiro Francisco Filipe Caravana que, sendo Governador Civil de Braga, impediu que esse Museu fosse retirado
ao Cabido ao abrigo da lei da Separação da Igreja e do Estado, e integrado no Museu
D. Diogo de Sousa como alguns pretendiam.
Nota - Aproveito a ocasião para rectificar um lapso que cometi quando me referi ao restauro do
Hospício dos Cónegos Regrantes de S.to Agostinho, onde depois se situou o hotel do Igo. Ao explicar a razão desta curiosa designação atribuía-a ao facto de um dos antepassados do benemérito Senhor João de Sousa Machado que está a restaurar o imóvel ser de origem galega donde a designação de Igo derivar do substantivo hijo. Ora na verdade esse hotel não pertencia a um dos antepassados desse Senhor, mas a um dos de sua Exma. Esposa. Aqui apresento as minhas desculpas por esse lapso.
Associado n.º 9 da ASPA